O meio pelo qual agressões verbais e ameaças são feitas não diminui a gravidade do fato. Assim, uma empresa foi condenada a pagar R$ 3 mil a um analista de suporte que foi xingado por seu superior hierárquico pelo aplicativo de mensagens WhatsApp.
O empregado afirmou à 2ª Vara do Trabalho de Brasília que prestou serviços para a companhia entre junho de 2014 e agosto de 2015. Ele contou que seu superior lhe impôs tratamento de rigor excessivo, com palavras de baixo calão, e que chegou a ameaçar chamar a polícia para retirá-lo de seu local de trabalho. Em contestação, a empresa alegou que o autor da reclamação sempre trabalhou com desídia, e que, por conta da constante insubordinação, ele se recusou a deixar o ambiente de trabalho certo dia, quando foi avisado que seria retirado do escritório pela polícia.
Em sua decisão, a juíza Larissa Lizita Lobo Silveira apontou que a empresa não contestou a cópia de uma conversa que o trabalhador teve com seu superior via WhatsApp em um dia em que se atrasou para o trabalho. No diálogo, que começou às 10h27, o superior diz que o horário de início da jornada diária é às 8 horas, com tolerância de 15 minutos, e manda o empregado voltar para casa e retornar no dia seguinte, revelando que ele teria registrado falta no dia. O funcionário tentou justificar o atraso, ressaltando que estava no hospital, que tinha atestado para o período da manhã, que a empresa não dispensava o mesmo tratamento para outros empregados que se atrasavam, e disse que não voltaria para casa. Ao final da conversa, já às 10h51, o chefe diz que se o trabalhador não fosse para casa, ia levar a polícia para colocá-lo para fora, a pontapés. “O que você tá pensando? Seu moleque! Quem manda aí sou eu! Seu M.”, concluiu o superior hierárquico por meio do aplicativo.
“Pela transcrição do diálogo acima referido, verifico que o representante legal da reclamada extrapolou do seu poder diretivo em face do reclamante, revelando o abuso de direito, nos termos do artigo 187 do Código Civil”, destacou Larissa. Para ela, ficou clara a violação aos direitos da personalidade do autor, “na medida em que o tratamento dispensado pelo representante legal da empresa foi desproporcional e desarrazoado, em típico abuso do poder diretivo concedido ao empregador, configurando-se a sua responsabilidade”.
A tese de defesa empresarial, no sentido de que o autor era desidioso e insubordinado no exercício de suas funções, não serve para justificar o abuso de poder cometido pelo representante legal da empresa, avaliou a juíza. De acordo com ela, a aplicação de punições por parte do empregador deve ser feita com limites e critérios, em especial respeitando a honra e a moral dos empregados, fazendo-se prevalecer o fundamento da dignidade da pessoa humana.
Fonte: Conjur
INTEIRO TEOR DA DECISÃO
PODER JUDICIÁRIO
JUSTIÇA DO TRABALHO
TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO – 10ª REGIÃO
2ª VARA DO TRABALHO DE BRASÍLIA-DF
Processo nº 0001368-15.2015.5.10.0002
ATA DE AUDIÊNCIA
Aos 27 dias do mês de maio de 2016, na sala de audiência da 2ª Vara do Trabalho de Brasília, sob a direção da Exma. Juíza do Trabalho Titular, Dra. Larissa Lizita Lobo Silveira, realizou-se a audiência referente ao processo nº 0001368-15.20145.5.10.0002, entre as partes Magno André da Silva e SAT Sistemas Comércio e Serviços Ltda - ME, Reclamante e Reclamada, respectivamente.
Às 17h10min, aberta a audiência, foram, de ordem da MM. Juíza do Trabalho, apregoadas as partes, ausentes.
SENTENÇA
Vistos etc.
Dispensada a elaboração de relatório, conforme previsto no art. 852-I, da CLT.
I - FUNDAMENTAÇÃO
DO DANO MORAL
Assevera o reclamante que prestou serviços para a reclamada no período de 09/06/2014 a 04/08/2015, na função de analista de suporte, com remuneração mensal de R$ 1.006,70 (um mil e seis reais e setenta centavos). Assevera que, durante o vínculo empregatício, foi vítima de danos morais. Esclarece que seu superior hierárquico “impôs um tratamento de rigor excessivo e proferia palavras de baixo calão no sentido de rebaixar e desonrar o Reclamante, inclusive realizando ameaças de retirar o trabalhador de seu local de trabalho por meio de força policial”. Pleiteia, assim, o recebimento de indenização por danos morais no valor de R$ 20.000,00 (vinte mil reais).
Na peça de resistência, a reclamada afirma que, desde a sua admissão o reclamante laborou com desídia, eis que sempre chegava atrasado. Disse que, no intuito de proporcionar tranquilidade ao reclamante no trabalho, realizou um adiantamento salarial a fim de saldar dívidas que o autor possuía com terceiros. Por fim, aduz que, em face de constante insubordinação por parte reclamante, que se recusava a deixar o ambiente da empresa, quando dispensado do trabalho por atraso na entrada, teve que avisar ao autor que “seria obrigado a chamar a polícia para o convidar a retirar-se da empresa”.
Aprecio a controvérsia.
Os arts. 186 e 927 do Atual Código Civil asseguram a reparação do dano, ainda que exclusivamente moral, causado por ato ilícito. A possibilidade de reparação do dano moral, aliás, restou consignada expressamente no art. 5º, incisos V e X da Constituição Federal de 1988.
A indenização por dano moral encontra seu fundamento no dano sofrido pela pessoa no campo dos valores não-patrimoniais, estando relacionado com a honra, a boa fama, a dignidade, a integridade física e psíquica, a intimidade, o nome, a imagem e com tudo que não seja suscetível de valoração econômica.
No campo do Direito do Trabalho a reparação do dano moral está revestida de importância peculiar, seja em razão do elemento subordinação presente no contrato de trabalho, que possibilita a existência de abusos e excessos no uso do poder diretivo, seja porque não se pode olvidar que um dos objetivos do Direito do Trabalho é assegurar o respeito à dignidade do trabalhador.
No presente caso, o reclamante juntou aos autos (fls. 18/25) cópia da conversa que manteve com o representante legal da empresa, via sistema whatsapp, cujo teor não foi impugnado pela reclamada, que se limitou a dizer que foram proferidas outras palavras pelo autor, porém sem nenhuma comprovação da sua existência.
Analisando o referido diálogo, verifico que o representante legal da reclamada, no dia 15/07/2015 às 10h27min, disse ao autor que “Nosso horário é as 8hrs. Tolerância até as 8:15. Volte pra casa. Retorne amanhã. Vc ficará com falta hj”. (fl. 18). O reclamante, então, tentou argumentar e justificar o atraso, aduzindo que estava no hospital e que outros empregados atrasados não teriam tido o mesmo tratamento. Porém, o representante da reclamada mostrou-se inflexível na decisão tomada.
Continuando o diálogo, após o autor dizer que “Vou pra casa não. Tenho atestado de manhã.”, às 10h51min, o representante da reclamada aduziu que “Se você não for pra casa vou aí com a polícia e coloco você pra fora a ponta pés. O que você tá pensando? Seu moleque! Quem manda aí sou eu! Seu merda!”.
Pois bem.
Pela transcrição do diálogo acima referido, verifico que o representante legal da reclamada extrapolou do seu poder diretivo em face do reclamante, revelando o abuso de direito, nos termos do art. 187 da Código Civil.
Houve clara violação aos direitos da personalidade do autor, na medida em que o tratamento dispensado pelo representante legal da empresa foi desproporcional e desarrazoado, em típico abuso do poder diretivo concedido ao empregador, configurando-se a sua responsabilidade, conforme previsão contida no art. 187 do Código Civil.
Ressalte-se, ainda, que a tese de defesa da reclamada no sentido de que o reclamante era desidioso e insubordinado no exercício de suas funções não serve para justificar o abuso de poder cometido pelo representante legal da empresa-ré. A aplicação de punições por parte do empregador deve ser realizada com limites e critérios, em especial respeitando a honra e a moral dos empregados, fazendo-se prevalecer o fundamento da dignidade da pessoa humana, previsto no art. 1º, III, da CF/88.
Assim, configurada a conduta abusiva do representante legal da reclamada (art. 187 do CC), resta aferir o valor da indenização que deverá levar em consideração a justa e adequada reparação do prejuízo moral sofrido, além de possuir um caráter pedagógico, a fim de prevenir que tal atitude, repudiada pela ordem jurídica, seja repetida em face de outros empregados da empresa.
Assim, fixo o valor da indenização por danos morais em R$ 3.000,00 (três mil reais), quantia que entendo razoável e adequada.
Defiro, nos moldes supra.
DOS BENEFÍCIOS DA JUSTIÇA GRATUITA
Diante da declaração de pobreza firmada pelo reclamante (fl. 08), nos exatos termos da Lei nº. 7.115/83, defere-se o pedido de concessão dos benefícios da justiça gratuita.
II - DISPOSITIVO
Pelo exposto, julgam-se PROCEDENTES EM PARTE os pedidos formulados, para condenar a reclamada a pagar aoreclamante, no prazo legal, as parcelas deferidas, tudo nos termos da fundamentação, parte integrante deste dispositivo.
Para efeito de cumprimento do art. 832, § 3º, da CLT, declara-se que a parcela objeto da condenação possui natureza indenizatória, não havendo incidência de Imposto de Renda e Contribuições Previdenciárias.
Liquidação da sentença por cálculos.
Juros e correção monetária na forma da lei e da Súmula 439 do C. TST.
Custas pela reclamada, no importe de R$ 60,00 (sessenta reais), calculadas sobre a condenação, ora arbitrada em R$ 3.000,00 (três mil reais).
Cientes as partes (TST, Súmula 197).
Nada mais.
LARISSA LIZITA LOBO SILVEIRA
Juíza do Trabalho
Titular da 2ª Vara do Trabalho de Brasília-DF
Nenhum comentário:
Postar um comentário