A atriz Nathalia Dill receberá indenização de R$ 80 mil, por danos morais, da editora Abril por ter sua imagem divulgada na revista Playboy sem autorização. A condenação foi mantida pela 15ª câmara Cível do TJ/RJ, que majorou a indenização antes fixada em R$ 50 mil.
Em matéria intitulada "Sexo na TV e no cinema 2012. Os filmes, as séries e as cenas que incendiaram as telas durante o ano. Haja extintor!", foram reproduzidas imagens nuas da atriz que fizera no filme "Paraísos Artificiais". A atriz afirma ainda que o texto tinha um tom depreciativo, indicando ser uma pessoa suscetível a atos obscenos e a usar drogas.
Em primeira instância, a editora foi condenada ao pagamento de R$ 50 mil. Mas tanto Nathalia quanto a Abril recorreram. A atriz pediu indenização por danos materiais, relativa ao lucro que deixou de ganhar caso tivesse sido contratada pela revista, e majoração dos danos morais. A editora pleiteou a reversão da sentença, alegando que a fotografia constante da reportagem nada mais é que a reprodução de uma cena pública do filme e que o texto se dirigia à personagem, não à atriz.
Ao analisar os recursos, o relator, desembargador Horácio dos Santos Ribeiro Neto, entendeu que não há "como afastar a má-fé da segunda apelante, a conduta sorrateira e dissimulada com o nítido escopo de mostrar a nudez da famosa atriz". Ante a gravidade da conduta, majorou o valor da indenização por danos morais.
"O exercício do direito à liberdade de imprensa é sagrado, mas não é ilimitado e, no caso concreto, a fronteira da licitude foi ultrapassada quando da exibição não autorizada da nudez da primeira apelante. É absolutamente irrelevante que, em decorrência da propagação do filme, a cena possa ser vista hoje facilmente na internet. É certo que, para a revista da segunda apelante, a primeira apelante não autorizou o uso de sua imagem."
Com relação ao texto, o magistrado verificou que realmente se dirigia à personagem. Quanto aos danos materiais, considerou ser cabível a indenização, tendo em vista que Nathalia "deixou de ganhar o que cobraria da segunda apelante para que essa exibisse o que mostrou". O valor deverá ser apurado.
Fonte: Migalhas
Inteiro teor da decisão
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO DÉCIMA
QUINTA CÂMARA CÍVEL
Apelação Cível nº.: 0136364-20.2013.8.19.0001
Apelante 1: Nathalia Goyannes Dill Orrico
Apelante 2: Abril Comunicações S. A.
Apeladas: As mesmas
Direito de Imagem. Liberdade de
imprensa x direito à imagem. Danos morais configurados. Verba indenizatória
majorada. Danos materiais existentes. Primeira apelação provida, desprovendo-se
o segundo apelo. 1. É ilícita a conduta de editora de revista erótica de, sob o
pretexto de noticiar filmes com cenas de sexo, exibe em duas páginas famosa
atriz em cena realizada para determinada película. 2. Ilícito que enseja não só
indenização por danos materiais quanto danos morais. 3. Há danos materiais
porquanto cabe à empresa jornalística indenizar à atriz o cachê que essa lhe
cobraria caso tivesse espontaneamente pousado para a reportagem, sendo certo
que o valor será objeto de liquidação de sentença. 4. Há ainda danos morais
ante a violação ao direito de imagem da atriz que não autorizou a veiculação de
sua nudez numa revista erótica. 5. Majoração da indenização por danos morais
que se impõe ante a extensão do dano, considerando-se a gravidade da conduta e
a tiragem da revista. 6. Em sendo a responsabilidade extracontratual, contam-se
os juros desde o ilícito. 7. Primeira apelação a que se dá provimento,
desprovendo-se o segundo apelo.
Vistos, relatados e discutidos
estes autos da Apelação Cível nº. 0136364-20.2013.8.19.0001 em que são
apelantes Nathalia Goyannes Dill Orrico e Abril Comunicações S. A. e apeladas
as mesmas,
ACORDAM os Desembargadores da Décima Quinta Câmara Cível do Tribunal de
Justiça do Estado do Rio de Janeiro, à unanimidade de votos, em conhecer das
apelações, dar provimento ao primeiro apelo e negar provimento à segunda
apelação, nos termos do voto do Exmº. Desembargador Relator.
RELATÓRIO:
Trata-se de ação de indenização
por danos materiais e morais proposta pela primeira apelante em face da segunda
apelante.
Na inicial, narra a autora que,
sem autorização, a ré veiculou, na edição de nº. 451 da revista Playboy por ela
editada, o seu nome e a sua imagem de maneira indevida. Informa que, na matéria
intitulada “Sexo na tv e no cinema 2012. Os filmes, as séries e as cenas que
incendiaram as telas durante o ano. Haja extintor!”, foram reproduzidas imagens
nuas que fizera no filme “Paraísos Artificiais”. Alega que, na mesma matéria,
havia um texto, o qual lhe dava um tom depreciativo, indicando ser uma pessoa
suscetível a atos obscenos e a usar drogas. Esclarece que, sistematicamente,
vem recusando propostas da ré para pousar nua. Alega que sofreu danos morais e
materiais, esses consistentes em valor semelhante ao mais alto valor que a ré
pagou por uma atriz ou modelo que pousou nua para sua revista.
Requer a condenação da ré ao
pagamento de indenização a título de danos materiais e morais.
A r. sentença de fls. 253/256,
integrada pela decisão de fls. 264, julgou procedentes em parte os pedidos para
condenar a ré a pagar à autora a quantia de R$ 50.000,00, bem como custas e
honorários advocatícios, estes fixados em 10% sobre o valor da condenação,
devendo a quantia ser corrigida monetariamente desde a publicação da sentença e
acrescida de juros desde a citação.
Apela a autora às fls. 265/277.
Insiste na ocorrência de danos materiais. Afirma que deixou de lucrar o que
ganharia da ré caso tivesse sido devidamente contratada para a exibição de sua
imagem nua. Alega ainda que a indenização por danos morais foi irrisória.
Pretende ainda que os juros de mora vençam desde o ilícito. Requer o provimento
da apelação para que a ré seja condenada a indenizar-lhe os danos materiais,
para que seja majorada a indenização a título de danos morais e para que os
juros de mora sejam contados desde o evento danoso.
Apela a ré às fls. 279/297.
Insiste na tese de que a fotografia da apelada foi utilizada para ilustrar
material de cunho jornalístico sobre os filmes e séries brasileiros de 2012.
Afirma que a fotografia constante da reportagem nada mais é que a reprodução de
uma cena pública do filme. Alega ainda que as menções no texto da reportagem se
dirigiram à personagem e não à atriz. Informa que a imagem da autora foi vista
por milhões de pessoas, no cinema, na televisão e na rede mundial de
computadores. Insiste na ausência de ilicitude em sua conduta. Nega a
ocorrência de danos morais. Pretende, subsidiariamente, a redução do valor
arbitrado. Requer o provimento da apelação para julgar-se improcedente o pedido
ou reduzir-se o valor indenizatório.
As contrarrazões de fls. 300/309
e de fls. 310/327 são, cada qual, pelo desprovimento do recurso da parte
contrária.
Certificou-se, às fls. 298 v., o
correto recolhimento do preparo de ambas as apelações.
É o relatório.
VOTO:
Os recursos de apelação são
tempestivos, adequados e foram devidamente preparados. Devem ser conhecidos.
Merece provimento o primeiro
apelo, desprovendo-se o segundo.
Prevê a Constituição Federal em
seu texto dois direitos absolutamente sagrados: o direito à intimidade, à vida
privada, à honra e à imagem e o direito à liberdade de imprensa.
Resulta, porém, que, como decorre
claramente do art. 220, § 1º. CF, o direito à liberdade de imprensa é
condicionado pelo direito à intimidade, à vida privada, à imagem e à honra.
No caso vertente, não há dúvida
da prática pela segunda apelante de conduta ilícita.
Com efeito, sob o pretexto de
fazer uma reportagem acerca dos filmes e séries lançados ao longo do ano de
2012 e que tivessem por temática o sexo, a segunda apelante não hesitou em
trazer para suas páginas a primeira apelante nua.
Ou seja, sob o pano de fundo da
reportagem, exibiu em suas páginas o que nunca fizera: a nudez da primeira apelante.
Não vejo como afastar a má-fé da
segunda apelante, a conduta sorrateira e dissimulada com o nítido escopo de
mostrar a nudez da famosa atriz.
É certo que a segunda apelante
edita uma revista erótica. É certo ainda que deve ser de interesse de seus
leitores saber quais os filmes e séries que abordaram o tema sexo, comum ao
propósito da revista. No entanto, não poderia a segunda apelante, sem a devida
autorização da primeira apelante, exibir sua imagem nua, valendo-se de cena de
filme e sem ostentar, inclusive, a devida autorização dos titulares dos
direitos sobre o filme.
O exercício do direito à
liberdade de imprensa é sagrado, mas não é ilimitado e, no caso concreto, a
fronteira da licitude foi ultrapassada quando da exibição não autorizada da
nudez da primeira apelante.
É absolutamente irrelevante que,
em decorrência da propagação do filme, a cena possa ser vista hoje facilmente
na internet. É certo que, para a revista da segunda apelante, a primeira
apelante não autorizou o uso de sua imagem.
Atente-se que a má-fé já começa
na capa, onde, apesar de não trazer qualquer imagem da primeira apelante, a
segunda apelante já menciona a reportagem e alude a diversas atrizes da
importância da primeira apelante, permitindo facilmente a ilação de que haveria,
na reportagem, como de fato houve, fotos mostrando a nudez das atrizes
referidas.
Não reputo ofensivo o teor da
reportagem pinçado e criticado na inicial. Com a devida vênia, é clara a
reportagem ao aludir à personagem, sendo certo ainda que dizer que a atriz
estava bem pouco tímida na pele da personagem importa, antes de qualquer coisa,
em meu modesto ver e sem pretender ser ingênuo, num elogio ao desempenho da
primeira apelante.
No entanto, é inegável que a
segunda apelante, por via oblíqua e ilícita, conseguiu trazer para seus
leitores um formidável atrativo: não só a nudez da primeira apelante, como a de
outras atrizes.
Caracterizado o ato ilícito, na
forma do art. 927 CC, deve a segunda apelante indenizar os danos causados à
primeira apelante.
Afasto-me da sentença. Não tenho
dúvidas de que a primeira apelante sofreu danos materiais, na modalidade de
lucros cessantes. Deixou de ganhar o que cobraria da segunda apelante para que
essa exibisse o que mostrou.
Assim, deve a segunda apelante
indenizar à primeira apelante os danos materiais apontados, procedendo-se à
liquidação por arbitramento. Nessa, deverá o perito apurar quanto a primeira
apelante receberia pela imagem exibida pela segunda apelante, se
voluntariamente tivesse com ela aquiescido. Observe-se, desde já, que o norte é
o que foi exibido, que não se confunde com qualquer ensaio fotográfico para a
mencionada publicação.
Tenho ainda que a primeira
apelante sofreu graves danos morais. Teve sua imagem, naquilo que lhe é mais
íntimo, ou seja, sua nudez exibida pela segunda apelante. Reafirmo que é
irrelevante que a cena tenha sido exibida no programa do Jô, que o filme esteja
hoje no Youtube. A primeira apelante não autorizou o uso pela segunda apelante
de sua imagem nua. Esse é o ponto nodal. E isso enseja indenização por danos
morais, ante a violação ao direito de imagem.
Observo que, no caso vertente, o
dano moral está in re ipsa. Ou seja, não há qualquer necessidade da prova pela
primeira apelante de que se sentiu ofendida pela lesão, que se presume de modo
absoluto. Incide, claramente, o que preceitua a Súmula 403 STJ:
“Súmula n.º 403
Independe de prova do
prejuízo a indenização pela publicação não autorizada da imagem de pessoa com
fins econômicos ou comerciais.”
Vislumbro ainda ofensa à dignidade
da atriz. A conduta da segunda apelante se revelou de extremo ardil. Exibiu aos
seus leitores a nudez da primeira apelante, sem a concordância dessa e sem que
lhe pagasse pela exibição. É inegável que a conduta da segunda apelante trouxe,
além da violação ao direito de imagem da primeira apelante, igualmente uma
ofensa à sua dignidade.
Ante a gravidade da conduta da
segunda apelante e considerando ainda a extensão do dano, porquanto a revista
Playboy apresenta expressiva tiragem e, inegavelmente, é uma referência no meio
das revistas eróticas, elevo a indenização por danos morais para R$ 80.000,00.
A hipótese é de ilícito
extracontratual. Por conseguinte, inclusive sobre a indenização por danos
morais, nos termos do art. 398 CC e Súmula 54 STJ, contam-se os juros de mora
desde o evento lesivo.
Prospera o primeiro apelo. O
segundo deve ser desprovido.
Por tais fundamentos, conhece-se das apelações, nega-se provimento ao
segundo apelo e dá-se provimento à primeira apelação para: a) julgar-se
procedente o pedido de indenização por danos materiais para condenar-se a
segunda apelante a indenizar à primeira apelante o valor que essa cobraria e
receberia se voluntariamente tivesse realizado a foto retratada na reportagem
para fins de publicação na revista editada pela segunda apelante, como se
apurar em liquidação de sentença, que se fará por arbitramento; b) elevar a
indenização por danos morais para R$ 80.000,00 (oitenta mil reais), devidamente
corrigidos a partir da presente data; c) dispor que os juros de mora incidentes
sobre os valores das indenizações, e no percentual de 1% ao mês, sejam contados
desde o evento danoso. Mantida, no mais, a r. sentença.
Rio de Janeiro, 07 de junho de
2.016.
Horácio dos Santos Ribeiro Neto
Desembargador Relator
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