A Primeira Turma do Tribunal Superior do Trabalho não admitiu recurso de um roteirista que pretendeu vínculo de emprego com a Globo Comunicação e Participações S.A., alegando que, por mais de 31 anos, teria sido obrigado a prestar serviços para a emissora, como pessoa jurídica (PJ), no programa Os Trapalhões. Segundo o trabalhador, houve contratos sucessivos de locação de serviços literários, entre sua empresa e a Globo, apenas para “mascarar a relação de emprego”.
O roteirista contou que foi contratado como empregado em 1973, com carteira assinada pela TV Globo Ltda., para exercer a função de produtor, e demitido sem motivo em 1976. Mas, quando foi chamado em 1981 para ser roteirista de programas, disse que a emissora exigiu que ele constituísse uma PJ para trabalhar nas mesmas condições de um empregado. Começaram, assim, os contratos com a Marte Produções Artísticas Ltda., cujos sócios eram ele e a esposa.
Em sua defesa, a emissora negou o vínculo de emprego e afirmou que não houve prova da coação e da fraude alegadas pelo roteirista. A 7ª Vara do Trabalho do Rio de Janeiro (RJ) julgou procedente o pedido e reconheceu a relação empregatícia de 1981 a 2013. O Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região (RJ) reformou a sentença, por considerar válidos os contratos entre as pessoas jurídicas em questão.
Para o TRT, não existiu subordinação entre as partes – condição essencial para se reconhecer o vínculo de emprego. “Os contratos firmados entre a empresa do autor e a ré somente demonstram que foi avençado que o obreiro redigiria programas e orientaria gravações, não havendo elemento a indicar subordinação”, destacou o Regional. Mensagens da Globo requerendo textos para determinados dias ou marcando reuniões não serviram de prova nesse sentido, pois a conduta é comum na prestação de serviços entre empresas.
TST
Relator do recurso do roteirista ao TST, o ministro Hugo Carlos Scheuermann disse que não havia condições processuais para conhecer do apelo e julgar o mérito do caso. Para ele, a indicação genérica de ofensa aos artigos 3º e 9º da CLT, “sequer atende ao requisito do artigo 896, parágrafo 1º-A, inciso II, da CLT, o qual exige a indicação, de forma explícita e fundamentada, de contrariedade a dispositivo de lei, súmula ou orientação jurisprudencial do TST que conflite com a decisão regional”.
Além disso, o ministro assinalou que o acórdão regional não confirmou a necessidade de as obras do profissional passarem pelo crivo do setor de censura da empresa ou mesmo de estarem submetidas à concordância dos superiores hierárquicos, como alegou o roteirista no recurso. “Tampouco há menção quanto ao fornecimento de pl
ano de saúde ao roteirista e a seus dependentes”, frisou. Para se chegar a uma conclusão diferente, seria necessário o reexame de fatos e provas, procedimento vedado em sede de recurso de revista (Súmula 126).
A decisão foi unânime.
Fonte: TST
PROCESSO Nº
TST-RR-11253-58.2013.5.01.0007
RECURSO DE REVISTA. INTERPOSIÇÃO NA VIGÊNCIA DA LEI 13.15/2014.
RELAÇÃO DE EMPREGO NÃO CONFIGURADA. CONTROVÉRSIA ACERCA DA DISTRIBUIÇÃO DO ÔNUS
DA PROVA. 1. O Tribunal Regional, a partir da
valoração das provas produzidas, reformou a sentença para afastar o vínculo de
emprego pretendido pela parte autora. 2. O Tribunal Regional não se
valeu das regras de distribuição do ônus da prova, a que aludem os arts. 818 da
CLT e 333, II, do CPC, para solucionar o litígio, o que somente se verifica
quando não produzidas provas ou essas se revelem insuficientes para formação da
convicção do juízo. 3. No caso, ao revés, o Tribunal Regional decidiu
com base nas provas efetivamente produzidas, de modo a afastar a violação dos
dispositivos legais invocados.
Recurso
de revista não conhecido.
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso de Revista n° TST-RR-11253-58.2013.5.01.0007,
em que é Recorrente EXPEDITO JOSÉ FAGGIONI e Recorrido GLOBO
COMUNICAÇÃO E PARTICIPAÇÕES S.A..
O Tribunal Regional do Trabalho da 1ª
Região deu provimento ao recurso ordinário da reclamada, para julgar
improcedente a reclamação trabalhista.
Contra
essa decisão, o reclamante interpõe recurso de revista, com fundamento nas
alíneas "a" e "c" da CLT.
O recurso
de revista foi admitido pelo Tribunal Regional, por possível violação dos
artigos 818 da CLT e 333, II, do CPC/1973.
Não foram
apresentadas contrarrazões.
Sem
remessa ao Ministério Público do Trabalho.
É o relatório.
V O T O
I –
CONHECIMENTO
1.
PRESSUPOSTOS EXTRÍNSECOS
Preenchidos os pressupostos genéricos de admissibilidade
recursal relativos à tempestividade, regularidade de representação e preparo,
prossigo no exame dos específicos.
2. PRESSUPOSTOS INTRÍNSECOS
RELAÇÃO DE EMPREGO NÃO CONFIGURADA. CONTROVÉRSIA ACERCA DA
DISTRIBUIÇÃO DO ÔNUS DA PROVA
Trata-se de recuso de revista interposto pelo reclamante
contra o acórdão proferido pelo TRT da 1ª Região, mediante o qual provido o
recurso ordinário da reclamada, para julgar improcedente a reclamação
trabalhista. Eis o teor do acórdão regional:
"CLT,
em seu art. 442, define contrato de trabalho como "o acordo tácito ou
expresso correspondente à relação de emprego", expressão que, como ensina
Délio Maranhão, in Direito do Trabalho, 8º ed., pág. 40, leva o intérprete a
girar em círculo vicioso, não só porque a definição nada esclarece a respeito
do que pretendia o legislador definir, mas também porque o contrato cria uma
relação jurídica, não corresponde a ela.
É, sem
dúvida, a interpretação dos artigos 2º e 3º da CLT que nos leva ao conceito de contrato
individual de trabalho, que, ainda segundo Délio Maranhão, "é o negócio
jurídico de direito privado pelo qual uma pessoa física (empregado) se obriga à
prestação pessoal, subordinada e não eventual de serviço, colocando sua
força-de-trabalho à disposição de outra pessoa, física ou jurídica, que assume
os riscos de um empreendimento econômico (empregador) ou de quem é a este,
legalmente, equiparado, e que se obriga a uma contraprestação (salário)."
Temos,
assim, como elementos indispensáveis à caracterização de todo e qualquer
contrato de trabalho regido pela CLT, a ocorrência de prestação de serviços,
por pessoa física, de natureza não eventual, a empregador, sob a dependência
deste e mediante salário.
No
caso, o autor alega que prestou serviços para a ré na função de roteirista no
período de 01/01/1981 a 31/12/2012, sendo que foi obrigado a constituir pessoa
jurídica - Marte Produções Artísticas Ltda – para mascarar a relação
empregatícia (id 6144164 - págs. 4/5).
A ré,
em defesa, nega o vínculo de emprego, aduzindo que a relação do autor se deu
através da empresa da qual este era sócio, pelo que a este competia a prova da
coação e fraude alegadas na inicial.
Compulsando-se
os autos, não se observa qualquer prova com o condão de evidenciar relação de subordinação
entre autor e ré.
Data
vênia do juízo a quo, os contratos firmados entre a empresa do autor e a ré
somente demonstram que foi avençado que o obreiro redigiria programas e
orientaria gravações, não havendo qualquer elemento a indicar subordinação.
Vale transcrever os trechos destacados pela sentença:
"O
objeto do presente Contrato é a cessão, por uma das partes à outra, do
profissional EXPEDITO JOSÉ FAGGIONI, em arte, EXPEDITO FAGGIONI, que também
firma o presente instrumento, solidário em todos os seus termos, para redigir
programas da CESSIONÁRIA, do gênero 'show', para televisão, por indicação da
mesma, e orientar as suas gravações" (id 7839680)
"O
objeto do presente Contrato é a cessão, por uma das partes à outra, do
profissional EXPEDITO JOSÉ FAGGIONI, em arte, EXPEDITO FAGGIONI, com absoluta
exclusividade para esta, em todo Território Nacional, que também firma o
presente instrumento, solidário em todos os seus termos, para produzir,
literariamente, programas, do gênero 'show', a critério da CESSIONÁRIA e
orientar a(s) sua(s) gravação(ões), escrita(s) por determinação da CESSIONÁRIA,
para ser exibida em televisão (...)" (id 7839730).
"(...)
com interveniência de EXPEDITO JOSÉ FAGGIONI, em arte, EXPEDITO FAGGIONI, neste
ato denominado simplesmente INTERVENIENTE, mediante as cláusulas e condições que
se seguem:
1 - DO
OBJETO
Constitui
objeto deste Contrato de locação, que a LOCADORA faz à LOCATÁRIA, dos serviços
profissionais do INTERVENIENTE, contratado exclusivo daquela e a quem incumbe
redigir programas 'OS TRAPALHÕES' ou outro em substituição (...)" (id
7840119).
Como se
vê, a redação é a que usualmente se utilizava em contratos de cessão de
serviços de natureza intelectual, sem qualquer indicativo de que haja
subordinação entre autor e ré. Também é normal que roteiristas, produtores e
artistas do gênero criem pessoa jurídica para prestar serviços, sobretudo em virtude
de vantagens em termos contábeis e tributários.
Os e-mails (exemplo, id 4040702 - Pág. 1) em
que a reclamada requeria textos para determinado dia e aquele (id 4040075 -
Pág. 1) em que é marcada reunião entre autor e ré não bastam para comprovar subordinação,
pois natural que, em contratos de prestação de serviços, o contratante requeira
que o contratado realize o objeto do contrato em determinado prazo, bem como
que, eventualmente, realizem-se reuniões para que as partes contratantes
discutam sobre detalhes do serviço, sobretudo em casos de trabalho de natureza
intelectual.
Dessa
maneira, considerando os contratos de prestação de serviços firmados entre a
empresa do autor e a ré, e tendo em vista que não há prova a evidenciar que o
obreiro estava subordinado àquela, não há como se reconhecer a existência do
vínculo de emprego pretendido pela parte autora, motivo pelo qual improcede o
presente pleito.
Prejudicada
a análise dos demais pedidos.
Dou
provimento."
Nas
razões recursais, sustenta o reclamante que o fundamento adotado pelo TRT para
afastar o vínculo empregatício reconhecido pelo Juízo de primeiro grau seria
"flagrantemente contraditório a farta, robusta e convincente prova documental
produzida". Alega presentes todos os elementos indispensáveis à
caracterização do vínculo empregatício, inclusive a subordinação. Diz que todas
as suas obras passavam pelo crivo do setor de censura da empresa e estavam
submetidas ao cumprimento de prazos e à concordância dos superiores
hierárquicos. Afirma que a empresa fornecia plano de saúde ao recorrente e a
seus dependentes. Argumenta que, "ao admitir a Ré a prestação de serviços
pelo autor, incumbia-lhe provar de que a mesma ocorreu sob a forma de natureza
civil, já que a presunção relativa de que a relação laboral ocorreu sob a forma
de um contrato de trabalho subordinado, por ser este o modo comum pelo qual se
formalizam os contratos de atividade". Indica violação dos arts. 3º, 9º e
818 da CLT e 333, II, do CPC/73. Transcreve arestos de Turmas desta Corte
Superior.
Ao
exame.
De
início, não prospera a alegação de afronta aos arts. 3º e 9º da CLT.
Conquanto
a parte transcreva, no início das razões recursais, o trecho do acórdão
regional que, no seu entender, demonstraria o prequestionamento da matéria, não
antedeu ao disposto no art. 896, §1º-A, III, da CLT, o qual também exige a
demonstração analítica de cada dispositivo de lei e da Constituição Federal ou
verbete jurisprudencial que se aponte contrariado, em relação aos fundamentos
jurídicos da decisão recorrida.
Por
sinal, a indicação genérica de que ofensa aos arts. 3º e 9º da CLT sequer
atende ao requisito do inciso II do art. 896, § 1º-A, da CLT, o qual exige a
indicação, de forma explícita e fundamentada, de contrariedade a dispositivo de
lei, súmula ou orientação jurisprudencial do Tribunal Superior do Trabalho que
conflite com a decisão regional.
Ressalta-se
que a mens legis não foi de impor à
parte um ônus de ordem apenas topográfica, mas sim de natureza jurídica, razão
porque não se pode cometer ao Ministro Relator do recurso de revista ou do
respectivo agravo de instrumento a tarefa de extrair, de ofício, o
pronunciamento contido no v. acórdão do e. TRT de origem apto a caracterizar o
prequestionamento, exatamente como se dava antes da vigência da Lei nº
13.015/2014 - sendo indene de dúvidas, conforme regra elementar de Hermenêutica
Jurídica, que implica violação da lei qualquer eventual interpretação dessa
última que, ao fim e ao cabo, venha a negar-lhe eficácia.
De
qualquer sorte, sequer há registro no acórdão regional acerca da alegada
necessidade de as obras do reclamante passarem pelo crivo do setor de censura
da empresa ou mesmo de estarem submetidas à concordância dos superiores
hierárquicos. Tampouco há menção quanto ao fornecimento de plano de saúde ao
recorrente e a seus dependentes.
Noutro
giro, ainda que a parte indique de maneira fundamentada a suposta ofensa aos
arts. 818 da CLT e 333, II, do CPC/73, verifico que o Tribunal Regional não se
valeu das regras de distribuição do ônus da prova para solucionar o litígio, o
que somente se verifica quando não produzidas provas ou essas se revelem
insuficientes para formação da convicção do juízo. No caso, ao revés, o
Tribunal Regional decidiu com base nas provas efetivamente produzidas, de modo
a afastar a violação dos dispositivos legais invocados.
Constata-se,
na verdade, do teor das razões recursais e dos trechos do acórdão regional
transcritos nas razões do recurso de revista, que a pretensão recursal tende ao
reexame e valoração do conjunto fático probatório, o que encontra óbice em
recursos de natureza extraordinária, conforme entendimento pacificado na Súmula
126/TST.
Por
fim, os arestos paradigmas coligidos não se habilitam ao cotejo, porque
oriundos de Turmas desta Corte Superior (art. 896, "a", da CLT).
ISTO POSTO
ACORDAM os Ministros da Primeira Turma do
Tribunal Superior do Trabalho, por unanimidade, não
conhecer do recurso de revista.
Firmado por assinatura digital (MP 2.200-2/2001)
HUGO CARLOS SCHEUERMANN
Ministro Relator
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