quarta-feira, 24 de agosto de 2016

Direito do Entretenimento - Espera em fila antes de show não gera dano moral


A 1ª Turma Recursal Cível do RS julgou improcedente a ação de duas pessoas que não assistiram a três shows do festival Planeta Atlântida, devido à longa fila para entrada no evento.
Caso
Os autores relataram que adquiriram ingressos pra o evento musical, pela internet, e que houve excessiva espera na fila para a retirada dos ingressos, o que teria resultado na perda de apresentações. Reclamaram da desorganização e ingressaram na Justiça com pedido de ressarcimento do valor dos ingressos e indenização por dano moral.
No Juizado Especial Cível da Comarca de Lajeado, o pedido foi considerado procedente. Na sentença, foi determinada a devolução do valor dos ingressos e pagamento de dano moral no valor de R$ 1 mil para cada autor.
A RBS Participações, responsável pelo evento, recorreu da sentença.
Recurso
Conforme a Juíza Mara Lúcia Coccaro Martins Facchini, relatora do recurso, por se tratar de um dos maiores eventos musicais do Estado, era esperado e previsível que alguma demora pudesse ocorrer. Assim, não se pode falar em frustração de expectativa do consumidor.
Mesmo que a irresignação dos autores refira-se ao tempo de espera na fila, não merece prosperar o pleito indenizatório, porquanto situação vivenciada que não ultrapassou o mero dissabor ou aborrecimento do cotidiano, pois em eventos de grandes proporções como o em questão, com número expressivo de pessoas, é inevitável a demora nas filas, bem como natural que se favoreça a quem segue a ordem de chegada com maior antecedência, afirmou a Juíza.
Com relação à devolução dos valores pagos pelos ingressos, a magistrada determinou o ressarcimento apenas da quantia equivalente aos três shows, ou seja, R$ 10,61 para um autor e R$ 6,95 para o outro.
Com relação ao dano moral, a Juíza ressaltou que não houve qualquer situação excepcional a justificar o pagamento de indenização. Com relação aos casos envolvendo atrasos de shows, informou que a questão já está pacificada entre as Turmas Recursais.
Por se tratar de mero descumprimento contratual, apenas há dano moral indenizável quando comprovadas situações extraordinárias, o que não restou configurado in casu, não sendo suficiente a alegação de longa espera na fila, ou ainda, de má organização do evento, destacou a Juíza.
Aos autores foi concedido apenas o ressarcimento do ingresso no valor proporcional aos três shows (R$10,61 para um autor e R$ 6,95 para o outro). Eles também foram condenados ao pagamento das custas e honorários ao advogado da empresa responsável pelo festival de música no valor de R$ 900,00.
Processo nº 71006183750
Fonte: TJRS
Inteiro teor do acórdão
recurso inominado. consumidor.  festival de música "planeta atlântida". indenizatória por danos materiais e morais. ALEGAÇÃO DE falha na prestação de serviço. fila de espera. retirada doS INGRESSOS APÓS O INÍCIO DOS SHOWS. DEVOLUÇÃO DOS VALORES DE INGRESSO  CORRESPONDE AOS SHOWS NÃO ASSISTIDOS. EVIDENCIADA má organização do evento.  AUSÊNCIA DE OFENSA AOS ATRIBUTOS DA PERSONALIDADE. ART.373, I, DO NCPC. ÔNUS DA PROVA DO AUTOR. DANOS MORAIS AFASTADOS. recurso dos autoreS DESPROVIDO E RECURSO DA RÉ PARCIALMENTE PROVIDO. 

Recurso Inominado

Primeira Turma Recursal Cível
Nº 71006183750 (Nº CNJ: 0028825-02.2016.8.21.9000)

Comarca de Lajeado
RBS PARTICIPACOES

RECORRENTE
EZEQUIEL CERBARO TOFFOLO

RECORRIDO
LEOPOLDINA ASSUNCAO DE OLIVEIRA

RECORRIDO

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos.
Acordam os Juízes de Direito integrantes da Primeira Turma Recursal Cível dos Juizados Especiais Cíveis do Estado do Rio Grande do Sul, à unanimidade, em NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO DOS AUTORES E DAR PROVIMENTO AO RECURSO DA RÉ.

Participaram do julgamento, além da signatária, os eminentes Senhores Dr. Roberto Carvalho Fraga (Presidente) e Dr. José Ricardo de Bem Sanhudo.
Porto Alegre, 26 de julho de 2016.
DRA. MARA LÚCIA COCCARO MARTINS FACCHINI,
Relatora.

RELATÓRIO
 (Oral em Sessão.)
VOTOS
Dra. Mara Lúcia Coccaro Martins Facchini (RELATORA)

Recorreu a ré da sentença que julgou parcialmente procedente a ação condenando-a ao ressarcimento de R$ 120,00 do valor dos ingressos e a indenizar cada um dos autores, por danos morais, no valor de R$1.000,00 por falha na prestação do serviço no festival de música "PLANETA ATLÂNTIDA".

Recorreram os autores para obter a majoração do valor  da indenização por danos morais.

Relataram os autores que adquiriram ingressos para o evento musical, pela internet, e que houve excessiva espera em fila para a retirada dos ingressos adquiridos, o que teria resultado perda de três shows, mencionando desorganização.

A situação narrada, de ter havido longa espera para retirada dos ingressos (pulseiras) que resultou no atraso e perda de três shows, pode ser  caracterizada como falha no serviço que resultou descumprimento parcial do contrato por parte da ré organizadora do evento (considerando que os autores não puderam assistir a 03 das 41 apresentações).

O Planeta Atlântida, como sabido de todos, é o maior evento musical do Estado, onde acontecem diversos shows musicais, com grande concentração de pessoas equivalente ao de uma cidade de porte médio,  com isso,  era esperado e previsível que alguma demora pudesse ocorrer, desse modo, não se pode falar em frustração de expectativa do consumidor.

 Conforme foi explicitado pela ré, não havia um ingresso de papel propriamente dito,  que devesse obrigatoriamente ser retirado no local do evento. O ingresso era representado por uma pulseira que poderia ser obtida no ato na compra presencial e ou poderia ser retirada em um dos pontos de venda. No caso, os  autores adquiriam pela internet e optaram por  retirar a pulseira no local do evento, com o que acabaram enfrentado fila e espera.

No tocante aos danos materiais, deve ser levado em consideração que os autores pagaram ingresso para assistir a 41 apresentações, nos valores de R$ 145,02 e R$ 95,00, como perderam apenas 03 shows, como referiram na inicial, no cálculo dos valores a serem devolvidos aos autores deverá ser abatido o equivalente aos 03 shows que teriam perdido. Dessa forma, a ré deverá devolver ao autor o valor de R$ 10,61 e à autora o valor de R$ 6,95.

Além disso, mesmo que a irresignação dos autores refira-se ao tempo de espera na fila, não merece prosperar o pleito indenizatório, porquanto situação vivenciada que não ultrapassou o mero dissabor ou aborrecimento do cotidiano, pois em eventos de grandes proporções como o em questão, com número expressivo de pessoas, é inevitável a demora nas filas, bem como natural que favoreça-se a quem segue a ordem de chegada com maior antecedência.

Ademais, cumpre referir que o relato da testemunha à fl.132 é claro ao referir que:

"Em um dado momento, diante das confusões, surgiu um homem com colete amarelo, para tentar auxiliar. Havia um segurança orientando sobre a entrada nos guichês."

Portanto, tem-se que a ré agiu com diligência na organização do evento, uma vez que a única testemunha arrolada pela parte autora, em seu relato assume que, de fato, mesmo em algum momento, houve segurança e auxílio para a retirada dos ingressos. Ainda, de serem considerados os diversos documentos acostados  pela ré mostrando as  orientações sobre o evento, via internet, inclusive sobre o sistema de segurança monitorado por câmeras, o que afasta a alegação de tratar-se de evento desorganizado.

Dessa forma, verifica-se que os autores não lograram demonstrar que sofreram ofensa aos atributos de sua personalidade, nos termos do art.373, I, do NCPC, limitando-se  a meras alegações quanto à falha na prestação do serviço da organizadora do evento, fator este que se não aliado a algum abalo moral evidente, não pode gerar o dever de indenizar, sob pena de enriquecimento ilícito.

No que diz com o pedido indenizatório por  danos morais, nada é devido pela ré, por não ter havido qualquer situação excepcional a justificar, como desrespeito ao consumidor ou frustração de expectativa.

Além disso, está já pacificado entre as Turmas Recursais Cíveis que, no caso relativo ao atraso de show, por se tratar de mero descumprimento contratual, apenas há dano moral indenizável quando comprovadas situações extraordinárias, o que não restou configurado in casu, não sendo suficiente a alegação de longa espera na fila ou ainda, de má organização do evento.

Nesse sentido, confira-se a ementa do Incidente de Uniformização de Jurisprudência nº. 71005156914:

INCIDENTE DE UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA. CABIMENTO DO PEDIDO DE UNIFORMIZAÇÃO PORQUE EXISTENTE DIVERGÊNCIA ENTRE AS TURMAS RECURSAIS CÍVEIS ACERCA DA APLICAÇÃO DO DIREITO MATERIAL RELATIVAMENTE AO ATRASO PARA O INÍCIO DA APRESENTAÇÃO DA CANTORA MADONNA. PRESERVAÇÃO DA SEGURANÇA JURÍDICA. ENTENDIMENTO UNIFORMIZADO NO SENTIDO DE QUE O ATRASO CONSTITUI DESCUMPRIMENTO PARCIAL DO CONTRATO QUE, NA AUSÊNCIA DE CONSEQUÊNCIA EXCEPCIONAL AOS ESPECTADORES, NÃO GERA INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. DEVOLUÇÃO DOS INCIDENTES ÀS TURMAS RECURSAIS QUE JULGARAM OS RECURSOS INOMINADOS PARA RATIFICAÇÃO OU NÃO DO JULGADO, A LUZ DO ENTENDIMENTO UNIFORMIZADO E DAS PECULIARIDADES DOS CASOS EM CONCRETO. CONHECERAM DO INCIDENTE, POR MAIORIA. UNIFORMIZADO O ENTENDIMENTO, POR MAIORIA, NO SENTIDO DE QUE O ATRASO OCORRIDO NO SHOW DA CANTORA MADONNA NÃO CARACTERIZA DANOS MORAIS, RESSALVADAS SITUAÇÕES EXCEPCIONAIS. (Incidente de Uniformizacao Jurisprudencia Nº 71005156914, Turmas Recursais Cíveis Reunida, Turmas Recursais, Relator: Roberto Arriada Lorea, Julgado em 16/06/2015)


O voto, pois, é no sentido de NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO DOS AUTORES e DAR PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO DA RÉ para condenar a ré à devolução dos valores R$ 10,61 (autor) e R$ 6,95 (autora), atualizados e com juros moratórios nos moldes da sentença, afastando indenização por danos morais.

Com fulcro no art. 55 da Lei n. 9.099/95[1], condeno os autores recorrentes, vencidos, ao pagamento das custas e honorários ao patrono do recorrido em R$900,00, considerando que, ao contrário do alegado, não possuem o benefício da Assistência Judiciária Gratuita, bem como incomprovados os rendimentos.

Dr. José Ricardo de Bem Sanhudo - De acordo com o(a) Relator(a).
Dr. Roberto Carvalho Fraga (PRESIDENTE) - De acordo com o(a) Relator(a).

DR. ROBERTO CARVALHO FRAGA - Presidente - Recurso Inominado nº 71006183750, Comarca de Lajeado: "NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO DOS AUTORES E DERAM PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO DA RÉ. UNÂNIME."


Juízo de Origem: JUIZADO ESPECIAL CIVEL ADJUNTO LAJEADO - Comarca de Lajeado



[1] Art. 55. A sentença de primeiro grau não condenará o vencido em custas e honorários de advogado, ressalvados os casos de litigância de má-fé. Em segundo grau, o recorrente, vencido, pagará as custas e honorários de advogado, que serão fixados entre dez por cento e vinte por cento do valor de condenação ou, não havendo condenação, do valor corrigido da causa.

Nenhum comentário:

Postar um comentário