O Ministério Público Federal (MPF) e o réu apelaram da sentença da 3ª Vara da Seção Judiciária do Pará, que absolveu o réu da prática do crime de descaminho (previsto no art. 334 do CP) e o condenou a dois anos e seis meses de reclusão e 50 dias-multa em razão do porte de arma de uso restrito (art. 10, §2º, da Lei nº 9.437/97), e três anos de detenção pelo delito previsto no art. 183 da Lei nº 9.437/97. A pena privativa de liberdade foi substituída por prestação pecuniária em favor de duas entidades assistenciais, consistentes no fornecimento de 08 (oito) cestas básicas no valor de 01 (um) salário mínimo cada.
O réu, então, acionou a justiça pedindo a nulidade da sentença por cerceamento do seu direito de defesa, pretendendo que fosse afastada a revelia, bem como o reconhecimento da prescrição da pretensão punitiva. No mérito, requereu a reforma da sentença para que seja reconhecida a improcedência da acusação, com a consequente absolvição com base no princípio in dubio pro reo e afirmou que a arma e a munição foram repassadas pelo avô ao pai e deste para ele próprio. Quanto ao rádio e telefone, afirmou ser de propriedade de irmão já falecido, com nota fiscal registrada no sistema do próprio aparelho.
De acordo com a denúncia, no ano de 1999, em cumprimento a mandado judicial de busca e apreensão visando coleta de elementos de prova relacionados à prática de tráfico internacional de entorpecentes, a Polícia Federal apreendeu, na residência do réu, um fuzil, Calibre 3.75; um telefone via satélite, um rádio VHF e uma caixa de munição calibre 3.75, todos de procedência estrangeira, sem comprovação de sua entrada regular no território nacional. O réu deixou de informar ao Juízo a mudança de endereço e não compareceu à audiência de interrogatório, e a revelia foi decretada.
O Ministério Público Federal postula a reforma da sentença para: 1) condenar o réu por descaminho, em relação ao rádio ICOM IC-A3 VHF, de procedência estrangeira; 2) reconhecer a prática de receptação no que diz respeito à arma de fogo e munição; e 3) aumentar a pena base dos delitos descritos no art. 10, §2º, da Lei nº 9.437/97 e no art. 183 da Lei nº 9.472/97.
Ao analisar o caso, o relator, desembargador federal Ney Bello, afirma que o laudo pericial confirma que a arma e munição encontradas em poder do réu eram de uso restrito, possuíam origem estrangeira e eram eficientes. O réu não demonstrou possuir registro da arma ou autorização legal para o porte e também, em relação ao delito de previsto no art. 183 da Lei nº 9.472/97, o laudo comprova que o rádio transceptor ICOM era utilizado pelo réu para atividades clandestinas de comunicação, e que o aparelho possuía determinada programação em sua memória que permitia o acesso rápido a 03 (três) canais restritos ao comando aeronáutico.
O desembargador assevera que o desenvolvimento de atividades de telecomunicação, uso de radiofrequência e exploração de satélite, sem o devido conhecimento pelo ente federal, é considerado pelo legislador como forma clandestina de agir, de tal gravidade, em vista do perigo a que expõe a sociedade, a ponto de reclamar a proteção da esfera penal.
O relator entende que esse tipo de conduta se trata de perigo real de interferência em frequências de rádio e na comunicação entre aeronaves e as torres de comando, que se potencializa com a proliferação da emissão de sinais sem o controle necessário do Poder Público.
O magistsrado destaca que o desenvolvimento clandestino de atividades de telecomunicação, tipificado pelo artigo 183 da Lei 9.472/97, constitui delito formal, não havendo necessidade de comprovação de potencialidade lesiva do aparelho.
Sobre a alegação do réu em relação à prescrição da pretensão punitiva estatal, ao argumento de que transcorreu mais de 14 anos desde a data dos fatos, o desembargador afastou a alegação de prescrição da pretensão punitiva e entendeu que “enquanto não houver o trânsito em julgado para a acusação, a contagem do prazo é feita com base na pena máxima abstratamente prevista no tipo penal”.
Quanto ao delito de descaminho, o relator entendeu que a sentença do Primeiro Grau deve ser mantida, pois o conjunto probatório não oferece elementos suficientes que indiquem ser o réu responsável pela introdução clandestina no país do mencionado bem. “Inexistindo juízo de certeza a respeito da autoria, a absolvição do acusado constitui medida necessária, com fundamento no princípio in dubio pro reo. O mesmo pode ser afirmado em relação à arma e munição.”
Sobre as penas aplicadas, o magistrado entendeu que a pena-base fixada na sentença para cada um dos delitos pelos quais o acusado foi condenado, não merece reforma. “A fixação da pena-base em patamar superior ao mínimo legal encontrou fundamento na culpabilidade”. O voto manteve também os demais aspectos da dosimetria.
A 3ª Turma do TRF1, por meio do voto do relator, desembargador federal Ney Bello, negou provimento às apelações e manteve a absolvição do réu em relação aos crimes de contrabando e receptação, mas confirmou a condenação pela prática dos delitos previstos no art. 10, §2º, da Lei nº 9.437/97 e no art. 183 da Lei nº 9.472/97.
Processo nº: 2007.39.00.006553-0/PA
Data de julgamento: 07/03/2017
Data da publicação: 17/03/2017
Fonte: TRF1
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