quarta-feira, 1 de junho de 2016

Direito Autoral - Artista está proibida de fabricar e vender imagens estilizadas de santos


A artista Ana Paula Dornelas Guimarães de Lima, responsável pela Santa Blasfêmia, está proibida de fabricar, comercializar e divulgar as estátuas de sua autoria, utilizando imagens de santos estilizadas. A decisão, em caráter de liminar, é do juiz Abílio Wolney Aires Neto, da 9ª Vara Cível de Goiânia, em face de ação de obrigação de fazer impetrada pela Arquidiocese da capital, representada por dom Washington Cruz.
Em suas obras, ela utilizou personagens da cultura pop, como Batman, Mulher-Gato, Chapolim Colorado e Galinha Pintadinha, para transformar imagens de gesso de santos. Caso haja descumprimento da medida, a artista está sujeita a multa de R$ 50 mil. A decisão abrange a exclusão dos perfis de divulgação do trabalho no Facebook e Instagram e a retirada dos produtos de uma loja em Brasília (DF).
Para o magistrado responsável pela liminar (foto à direita), é preciso ponderar a liberdade de expressão – no caso, a manifestação artística e intelectual da parte ré – com o livre direito de religião, bem como a proteção dos locais de culto e das suas liturgias, todos previstos na Constituição Federal.
“Muito embora os direitos e garantias fundamentais estejam na mesma ordem, sem hierarquia ou primazia de um direito sobre o outro, quando houver conflito entre eles, deve prevalecer o direito à dignidade pessoal, à honra, e à vida privada, que no caso a Igreja Católica, a Santa Sé, é pessoa jurídica de direito público (…). A requerida, ao confeccionar imagens satirizadas dos santos representantes da Igreja Católica, está deliberadamente extrapolando ao seu direito Constitucional e obstando o direito de imagem da requerente”, destacou  Abílio Wolney Aires Neto.

Fonte: TJGO

INTEIRO TEOR DA DECISÃO

DECISÃO 
ARQUIDIOCESE DE GOIÂNIA, pessoa jurídica de direito privado, por seu representante legal, Dom Washington Cruz, ingressou com a presente ação de obrigação de não fazer com pedido de antecipação de tutela, em face de ANA PAULA DORNELAS GUIMARÃES DE LIMA, devidamente qualificada nos autos.
Alega a autora na inicial que a requerida vem utilizando-se de bases de gesso, ou material semelhante, próprias para a confecção de imagens de santos da Igreja Católica Apostólica Romana, para confeccionar sátira de personagens da cultura pop, tais como: O Vingador, Batman, Mulher Maravilha, Bruxa Malévola, Frida Kahlo, David Bowie, Galinha Pintadinha, Minnie, pleiteando ao final a tutela antecipada. Juntou os documentos de fls. 14/117. 
É O SINTÉTICO RELATÓRIO. DECIDO. 
Os pressupostos processuais de desenvolvimento válido e regular bem como as condições da ação se encontram presentes de forma escorreita. 
A tutela antecipada, espécie das tutelas de urgência, antecipa os efeitos do provimento final pretendido pelo autor em observância ao princípio da efetividade, mas em detrimento aos princípios do contraditório, da ampla defesa e do devido processo legal, pois concede-se o direito pleiteado sem a entrega definitiva da tutela jurisdicional, carecendo assim de obediência a requisitos insculpidos na lei. 
Em razão disso, o art. 300 do CPC/15 exige a presença da probabilidade do direito (fumus boni iuris) e do perigo de dano (periculum in mora), e desde que não haja perigo de irreversibilidade dos efeitos da decisão (§ 2º). 
No caso vertente vislumbro estes elementos. Explica-se. 
Em princípio, é de se ressaltar que a Constituição Federal de 1988, artigo 5º, incisos IX e XVI, no Capítulo dos Direitos Fundamentais, prevê a liberdade de expressão e reunião, in verbis: 
IX - é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença; 
XVI - todos podem reunir-se pacificamente, sem armas, em locais abertos ao público, independentemente de autorização, desde que não frustrem outra reunião anteriormente convocada para o mesmo local, sendo apenas exigido prévio aviso à autoridade competente; 
Da mesma forma, o citado artigo 5º, VI, da Lei Maior garante a inviolabilidade de consciência e de crença, assegurando o livre exercício dos cultos religiosos e garantindo, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e as suas liturgias. 
Eis o mencionado dispositivo: 
"VI - é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias;" 
Nessa linha de raciocínio, registre-se que, muito embora os direitos e garantias fundamentais estejam na mesma ordem, sem hierarquia ou primazia de um dirito sobre o outro, quando houver conflito entre eles, deve prevalecer o direito à dignidade pessoal, à honra, e à vida privada, que no caso a Igreja Católica, a Santa Sé, é pessoa jurídica de direito público por constituir um país soberano, o Vaticano, logo gozo da proteção Constitucional por possuir personalidade jurídica. 
In casu, a Requerida, ao confeccionar imagens satirizadas dos santos representantes da igreja católica, está deliberadamente extrapolando ao seu direito Constitucional e obstando o direito de imagem da Requerente. 
De tal arte, a pretensão inicial é procedente. Ao exposto, DEFIRO A ANTECIPAÇÃO DE TUTELA pretendida para, sob pena de multa de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais), compelir a Requerida a: 
a) não fabricar, vender, conceder, doar, permutar ou transmitir por qualquer modo a terceiros peças, imagem/estatueta e/ou ícone que tenha como base os santos e os símbolos pertencentes à Igreja Católica Apostólica Romanda ou que façam alusão a eles, descaracterizando-os com a inserção da cultura e/ou características populares;
 b) valer-se do conteúdo ora discutido como meio de propaganda e/ou projeção; 
c) excluir da internet, principalmente das redes sociais Facebook e Instagram, toda e qualquer imagem que tenha como base os Santos e os símbolos pertencentes à Igreja Católica Apostólica Romana ou que façam alusão a eles, bem como toda e qualquer divulgação das peças já fabricadas; 
d) retirar da loja “Endossa”, em Brasília, bem como determinar a proibição da venda, cessão, doação ou qualquer tipo de transmissão a terceiros das peças fabricadas pela requerida, que tenham como base os santos e os símbolos pertencentes à Igreja Católica Apostólica Romanda ou que façam alusão a eles; 
e) excluir da internet o perfil social “santa blasfêmia” das redes Facebook e Instagram; 
Determino, ainda, que se proceda a cientificação da presente decisão, via postal, à loja “Endossa”, no endereço constante da inicial, a fim de que a mesma se abstenha de comercializar, ceder, doar ou qualquer outro ato, relacionados aos produtos objetos da presente ação, sob pena de incorrer na mesma multa cominatória diária imposta à requerida. 
Expeça-se o mandado proibitivo. 
Após o cumprimento das diligências ora determinadas, com a entrada em vigor da Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015, publicada no Diário Oficial da União de 17-3-2015, tendo em vista que a opção ou não pela audiência de conciliação é requisito da petição inicial (art. 319 VII do CPC/15), sendo ainda obrigatória a manifestação expressa do réu em desinteresse, por paridade de tratamento e obediência aos dispositivos legais, intime-se a parte autora para, no prazo de 15 (quinze) dias (art. 321 CPC/15), manifestar expressamente pelo interesse ou não na audiência de tentativa de conciliação. Após, venham-me os autos conclusos para deliberação. 
Intime-se a parte autora via D.O. (art. 334, § 3º do CPC/15), salvo se tratar-se de parte representada por advogado dativo, Ministério Público (substituído) ou Defensor Público.
Intimem-se. 
Goiânia, 22 de março de 2016. 
Abílio Wolney Aires Neto 
 Juiz de Direito 

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